quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Videoclipe é Arte?

Por Cristian Boragan

Anos 20, a recém-criada sétima arte entra numa fase de vanguarda e com ela os cineastas Dziga Vertov e Walther Ruttman começam a articular imagens, música e novas formas de montagem para conseguir modelos inéditos de narrativa. Para estes cineastas, novas formas significavam uma transcendência do meio (cinema) frente ao teatro e literatura. As obras O Homem com a Câmera e Berlim e Sinfonia da Metrópole se parecem muitos com os atuais videoclipes.

Musicais ou filmes cheios de música já eram muito utilizados por Hollywood nos anos 50, mas em nada diferiam da experiência de um show, por exemplo. Quando no início da pesquisa sobre videoclipes, acreditei que o primeiro era Rock Around de Clock. Nada disso. Em poucos cliques, descobri que o primeiro foi um vídeo publicitário dos Beatles, da música Strawberry Fields Foverer, de janeiro de 1967. Ao assisti-lo, o espectador também não terá mais dúvidas: estamos diante de um legítimo videoclipe.

Mas, o que diferencia a estética videoclipe daqueles filmes musicais de Elvis Presley dos anos 50, por exemplo?

Alguns elementos – que serão continuamente abordados neste blog – dão as pistas:

- Montagem (ou cortes): transição de uma imagem para outra. Geralmente em videoclipes, as imagens duram poucos segundos e a montagem é feita de forma fragmentada, descaracterizando a linearidade da cena;

- Iconografia: são os elementos que reforçam a identidade cultural, coisas como figurinos, cenários surreais, animações e tipografias próprias.

É um termo que parece fora de lugar, mas, o que mantém coeso um videoclipe?

Para muitos, o videoclipe não possui lógica alguma. Se assim é, então, qualquer seqüência de imagens aleatória montada sobre uma trilha sonora pode ser considerada um videoclipe?

Não. O videoclipe possui uma coesão cultural e sinestésica que, não raras às vezes, nada tem a ver com a letra da música. Este é o objetivo deste blog, traduzir um pouco desta Estética Videoclipe. Embora porta-estandarte da cultura pop, portanto, feita especificamente para o consumo das massas, a estética videoclipe possui valores artísticos que influenciam cinema, TV (MTV & Cia), vídeo arte e agora a Web.

Sobre Strawberry Fields Forever

Traduzindo ao pé da letra, o que temos é o Campo de Morangos. Na realidade, ele nunca existiu. Strawberry Fields era o nome de um terreno em Liverpool onde se localizava o Exército da Salvação. John Lennon costumava brincar no local durante a infância.

A canção fala sobre a recordação da infância, de lembranças líquidas que temos e que na idade adulta tornam-se cercadas de uma espécie de aura sagrada. É uma música sobre recordar.

Ao estilo próximo do cineasta da memória Allain Resnais em um dos seus mais conhecidos filmes, o Ano Passado em Marienbad (1961), o clipe traz esta aura mágica da lembrança. Dá-se a impressão que John Lennon, da idade adulta, consegue transcender tempo e espaço e volta para o seu magnífico Strawberry Fields juntos com seus outros três amigos de Liverpool.

As seqüências são de um sonho estranho e bom. Os recursos de montagem, se comparados aos dias atuais, são simples, mas geniais. E os Beatles? Eles também não foram assim? Segundo o filósofo Rumi do século XII, “existe um lugar que devemos encontrar além do certo e do errado”, um ponto de segurança. Para John, Paul, George e Ringo, este lugar é Strawberry Fields.

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